domingo, 14 de junho de 2015

Alfredo Chlamtac Filho Em Poesia * Antonio Cabral Filho - RJ

ALFREDO CHLAMTAC FILHO, POETA,
de camisa social azul, no lançamento do livro
POETAS 10ENGA VETADOS
em dezembro de 1995.

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Primeiro, quero dizer que falar dos amigos é sempre difícil; falar dos  amigos com os quais concordamos também é difícil, mas falar dos amigos dos quais discordamos e mesmo assim conseguimos ser amigos, esses, são especiais. é  o caso do ALFREDO CHLAMTAC FILHO. Sempre "batemos de frente" nas opiniões, mas na hora das "DIRETAS JÁ!" nós estávamos ombro a ombro de faixa na mão; na hora da CONSTITUINTE ídem; na hora do "LULA LÁ!" também e o mais interessante é que tínhamos "leituras" discordantes sobre as mesmas coisas. Aí ele me acusava de "IMEDIATISTA", dizendo que eu só queria ver como seria um operário presidente, que eu só queria a democracia, que eu não era MARXISTA, e que ele queria o SOCIALISMO e que até lá.... TUDO É TÁTICO. Eu concordava, mas ele retrucava dizendo que dispensava o meu apoio, uma vez que o meu método de luta era só LEGAL e não REVOLUCIONÁRIO. Impaciente, com a cabeça cheia de "teorréias ", mandava ele sentar no método revolucionário...


Segundo, quero falar sobre a poesia do meu amigo, pois através dela, aprendi muito do que acredito ser atualmente, ou seja, um homem com visão cada vez mais ampla dos problemas humanos e que não acredita mais nas " ações diretas já!", pois se a solução fosse ir alí na esquina e matar alguém que EU responsabilize pelas desgraças do mundo, tudo estaria resolvido;  mas não está e o pior é isso... Mas foi pela convivência com pessoas como Alfredo e Pedro Giusti que eu fui "descobrindo as coisas", a despeito de dezenas de livros lidos e debates debatidos...

Mas eu não conheço nada melhor para  mostrar quem somos nós do que um texto, um desenho, uma música, enfim, algo que vem do nosso subconsciente, como a poesia... E o primeiro texto que eu conheço do ALFREDO é "  CARTA SEM DESTINO , com a seguinte epígrafe (... metrificando assim meu verso marginal de perseguido  /  que vai cair baldio num terreno abandonado. trecho do poema de Afonso Romano de Santana, Rainer Maria Rilke e eu).

Uns textos restritos pelas duras condições de existir organicamente dos autores, quer dizer assim:  a revista existe, depois de cinco anos de um parto, projeto de edição, algo novo, inusitado, além parâmetros comuns, alguma coisa que extrapola, que salta os muros, que rompe as barreiras no sentido da autodescolonização dos sentidos, está assim pois no âmago da questão de forma incontestável.

Enquanto isso, na mesa dum editor bem no bum  permanente da literatura importada, muitos autores estrangeiros da moda na moda  sempre rendosa das traduções  que fazem as caixas  registradoras funcionarem  e as cabeças ficarem domesticadas. 

Dinheiro, dinheiro, dinheiro, a mola que mexe a caldeira do diabo, que fomenta as reputações, as guerras e as desesperações dos verdadeiros artistas ( almas videntes deslocadas  no além-mundo , onde vale tanto a folha que cai da árvore  como um pedaço de papel  onde está pintada a cara de um personagem e um número de valor.).

Fazer a revistas poética ( FEIRA ) , pretensão de ser testemunha  de uma geração  cortada na raiz, uma explosão de criatividade, afinidade aos mestres e à vida.

Abre-se uma perspectiva para quem deseja  lá chegar um dia, ou seja, ver em caracteres impressos... não assim não; Artaud disse... não assim também não; seriedade cara, discurso lógico, a-emoção, fora da luz não, olha o enquadramento, cuidado com o foco narrativo.

Uns autores, uns mosquitos, umas moscas, uns originais sobre a mesa, retrato de ANA C. olhando linda , perguntando do porque da morte  pra ver sair um livro publicado. Indagando: até quando há de ser assim?

Não, assim não; bem, bom, uns editores, uns leitores especiais que analisam os textos e adquirem os mais significantes e evolutivos  criadores do fazer  literário de agora, os que tentam ocupar o vácuo deixado pela cassação ( caçação ) e perseguição da inteligência nacional executada cientificamente nas duas últimas décadas.

Em função disso, na mesa daquele editor, bem no bum da literatura estrangeira, mais uma tradução rendosa ( do METAMORFOSE de Franz Kafka existem três ou mais ) pra ser despejada no mercado, várias tiragens de muitos mis exemplares, garantido retorno de capital na capital do eixo cultural do país.

Modernos tempos do DAS CAPITAL.

Sabe de uma coisa, deixa isso pra lá de literatura figura, de testemunho das futuras gerações, vá plantar batatas no quintal da sua casa e esqueça as vanguardas ali onde possivelmente jazem sem fronteiras e vá plantar mamão com a mão que redige as linhas; linhas e mais linhas sem as luzes dos " clássicos " com seus traseiros de bronze e que vão sendo traduzidos e publicados, vendidos/comprados em todas as ´principais cidades do país por/para  uma multidão de leitores  bisonhos que garantem a marginalização dos possíveis novos talentos, assim como garantem a dominação cultural no plano literário neste nosso "patriarcado" bíblico como disse Graciliano Ramos.

ANA C. olha-me através das lentes dos óculos; acabo de levantar os olhos do papel e vejo a lua cheia atras das folhas do coqueiro. Choro. Alfredo Chlamtac Filho. "

O texto acima é do período 1980/1981, época em que POETAS ALTERNATIVOS, POETAS MARGINAIS, enfim, a MARGINÁLIA LITERÁRIA em geral juntou-se e produziu uma FEIRA LITERARIA na CINELÂNDIA, que foi durante uns dois anos  o PROGRAMA CULTURAL da juventude que iria engrossar as passeatas ao som de LEGIÃO URBANA...


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TREM DA CENTRAL

Cartazes gigantes
fazendo apelos
publicitários
aos corações.
Nos bolsos dos passantes
um vazio progride
desesperado.
Anuncio de tempestade
produzida pelas nuvens
da falta geral
nas barrigas roncantes
que atravessam subúrbios
para ir aos trabalhos
num trem da central.

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